quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Conclusões de 2011

Sair do Rio de Janeiro é fácil, meu bem, o Rio sair de você que é impossível.

Quando a sorte bater na sua porta, dê um jeiro de recebê-la. Pule a janela, arrombe a fechadura, quebre a vidraça. Pode ser que ela volte mais animada uns dois dias depois, pode ser que ela nunca volte. Não corra o risco.

o tempo é implacável e a vida extremamente objetiva. Crianças crescem, sonhos ficam velhos e, sim, as pessoas que te amam também vão embora. Não leve trabalho para casa, não passe horas contando seu dinheiro ou brigando porque a pia está cheia de louça suja. O destino não espera a sua raivinha passar para se cumprir. Faça um carinho em quem aquece o seu coração agora, já! Pode ser que amanhã você não tenha essa chance.

Você pode ser forte como um Touro ou como quem nasce regido por esse signo, mas há cargas que você vai precisar dividir para poder suportar. Pedir ajuda não arranca pedaço, nem diminui a sua grandeza, é um ato de coragem e lucidez. Ninguém dá conta do mundo sozinho. Ninguém.

Nunca diga nunca, a não ser que você esteja morto! Você não sabe quem vai resolver ter um perfil no Facebook, mudar o status de relacionamento ou resolver reatar com bons e velhos amigos. A vida é dura, mas traz um monte de surpresinhas agradabílissimas. Não perca a fé nos acasos do destino.

Não tenha medo de conjugar o verbo desistir na primeira pessoa do singular em qualquer tempo. Dói nem menos que conviver com as palavras sofrimento, angústia, impotência, instatisafação, infelicidade e descrença.

Não dá pra escrever uma nova frase, um novo parágrafo, muito menos um novo capítulo na vida sem marcar o anterior com um ponto final. Um ponto final sereno, tenso, risonho ou triste, mas ele é necessário. Tem gente que acredita que dá para driblar a vida e ficar só com os brindes e dias de sol que viram foto nas redes sociais. Não se engane, as desilusões e os desamores não esquecem de ninguém.

Quem quer dá um jeito, quem não quer arruma uma desculpa. Quem está disposto não se intimida com um não, uma agenda lotada, um fim de tarde chuvoso ou um engarrafamento. Não se permita acreditar em justificativas cretinas para adiar a vida, não seja covarde para arrumar desculpas para ninguém, muito menos para a pessoa que você enxerga no espelho.

Ninguém erra por amor ao esporte de arcar com as consequências. As pessoas acabam devendo para o banco, se apaixonando por outras que são comprometidas, brigando com quem amam, queimando as pontes que às ligam aos sonhos? Sim. Elas serão punidas? Talvez... Mas você não tem o direito de julgar ninguém que tentou ser feliz.

O sofrimento ensina demais, muito mais que a alegria. Mas não há mal que sempre dure e nem bem que não se acabe. Por isso, eu acredito que 2012 será melhor. Bem melhor.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Oito do Doze

Tem mais de 20 anos, mas eu me lembro dos flashes daquela manhã de quinta-feira como se fosse hoje. Era um dia de sol, vovó me acordou, me enfiou num uniforme de verão, me penteou e me colocou na mesa do café. Nosso apartamento era pequeno demais para aquele silêncio todo. Perguntei sobre mamãe e papai, a vovó respondeu que eles tinham ido para o hospital para ganhar o bebê.

Na porta do prédio, uma amiga da família me esperava dentro de um Fusca tão velhinho quanto claro. No caminho para a escola, não conversei. Ela falava comigo, mas eu estava pensando em como o bebê sairia da barriga da minha mãe. Quando cheguei à escola, a tia do maternal me deu bom dia e eu respondi “Bom dia, tia! Sabia que o meu irmão nasceu hoje?”. Mentira duas vezes. Meu irmão só nasceria uma hora depois e eu nem sabia mesmo se era um menino, mamãe se recusou a saber o sexo do bebê antes do parto.

Não lembro se brinquei, nem como voltei para casa. Quando cheguei, minha avó estava extasiada. Ela, que era séria e de vez em quando até rabugenta, naquele dia estava pendurada num sorriso gigante. Almoçamos, ela me deu banho, me vestiu com uma daquelas roupas que me faziam parecer uma boneca e saímos.

Quando chegamos ao hospital, os seguranças não queriam me deixar entrar por ser pequena demais. Vovó argumentou que tinha vindo de longe, que éramos só uma velha e uma menina querendo fazer uma visita, e entramos. No quarto, mamãe estava numa cama que eu achei muito alta, no canto tinha um sofá que eu achei muito sem graça e um berço que eu achei muito vazio. Minha mãe me beijou, mas estava esquisita, falando devagar, parecia estar com sono e a vovó disse que eu não podia ficar sentada perto dela. Claro que não ia adiantar me explicarem o que era uma cesariana e que anestesias deixam as pessoas fora do eixo.

Dali a pouco, entraram com um pacotinho que se mexia e o deixaram com a mamãe, que ria e o mostrava para vovó. Me esticava inteira, mas não via nada. Dali a pouco, subi os três degraus que ligavam o chão à cama e finalmente vi o bebê. Ele era lindo, bochechudo, cabeludo e confirmava tudo o que aprendi sobre crianças que saiam de barrigas: não sabia falar, andar, dançar e nem comer sozinho. Ou seja, eu, do alto dos meus dois anos, sete meses e dois dias, teria que ensinar tudo para ele. Levei isso a sério. Mais tarde, vovó diria que ele não andava e falava por minha causa, eu pegava tudo para o que ele apontava e descrevia tudo para o que ele olhava.

Não me lembro de quando ele foi para casa. Só sei que não podia agarrá-lo e ele foi crescendo sem gostar de ser agarrado, como qualquer sargitariano. Isso era uma situação difícil para uma taurina que, além de gostar de agarrar, era teimosa. Por isso, enquanto ele dormia, eu ia até o berço para ver como ele era bonito com os olhinhos fechados e fazer carinho. Sempre acabava com o indicador preso na palma da mãozinha dele.

Aprendi que se me jogasse no chão e fizesse palhaçada, ele parava de chorar. De verdade, ao longo desses anos que separam a manhã de hoje daquela outra, aprendi muito mais do que ensinei. Aprendi a dividir, a ser responsável por alguém, a entender que dá para amar desesperadamente mesmo sendo completamente diferente do outro e que ter alguém que chora as mesmas lágrimas conforta.

Não preciso contar que aquela criança, que foi um menino chorão com quem eu briguei demais, virou um homem maior que eu. Por mais que o tempo passe, que ele tenha barba e seja dono dos próprios passos, para mim, ele sempre será aquele bebê que eu vi entrar no quarto empacotado.